Não saberás diagnosticar o
momento
De tanto que se fala da
dor da partida
Serás mais um, como
todos
A acreditar que algum amor
algum dia acaba
Por se dizer que acabou
E que partir pode não
doer, se fugires e te esconderes,
Para não o ver chegar
Partir dói? Pergunto-te.
Partir só dói antes de
partir.
Dói por não teres
completamente estado
Teres-te amordaçado,
negado e calado
Levado o corpo a outro
lugar
Quando o coração sabia bem
onde queria estar
Partir dói? Pergunto-te.
Partir só dói quando te
esqueces que ficaste
Dói o adeus que, aflito
Todos os dias te batia à
alma
Enquanto tu te negavas a
abrir ou a fechar a porta
Como alguém que,
apaixonado pela vida
Se descobre de morte
marcada
E não sabe se há-de
antecipar a morte ou prolongar a vida
Partir dói? Pergunto-te.
Dói a partida que à porta
espreita
O que dói é essa porta
entreaberta
Por onde espreitaste
E depois não a abristes, nem
fechastes
Numa estranha dança
preventiva da vida
Famosa nos salões do mundo
Que uns chamariam bom
senso, e outros, covardia
Partir dói? Pergunto-te.
Não, partir em si não dói
Quando o fim chegar
Depois de se pavonear à
beira do teu espirito
Cada dia maior
Engordado pelo teu medo de
o mandar embora
Não te irá doer
Terás a alma anestesiada
Estarás morno
Insonso
Desprovido de coisas
intensas
Pela dor antecipada que
permitiste que te roubasse os dias
Pelos adeus pequeninos que
disseste
Pelos desencontros que
calaram as chegadas
Partir dói? Pergunto-te.
Ah, mas como dói! Mas não
para ti, que não mereceste tal dor
Partir dói sim
Mas a dor da partida é
para quem viveu
É a dor que só chega aos
guerreiros
Que se negam a abraçar a
calmaria da desistência
A mornice da existência
que não é vida
É um desfecho glorificador
Uma presença intensa
Que se nega a palcos
menores
Onde só esteve quem não se
atreveu a viver mais que metade
A guardar pedaços de vida
para depois
Para ti, outras dores quaisquer
Nunca a glória da dor de
partir
Março de 2017
💖 triste mas maravilhoso.
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